domingo, 1 de agosto de 2021

 SANTOS DUMONT 47

Naveguei em tempos de temporais
Atirei pedras nos trilhos
Atravessei o asfalto
Atropelei um automóvel veloz
O primeiro amigo caiu da infância
Muito cedo observei um pai chorar
Nāo aprendi a me despedir de ninguém
Santos Dumont! Eu preciso voar!
poeta e compositor

sábado, 19 de janeiro de 2019

TERNO ENGOMADO

Na vertigem das linhas
Dobram-se horas
Destilam orvalhos

Na vertigem das linhas
Espasmo do tempo
Dobram-se vidas
Desfilam sapatos
Engomam colarinhos


Na tábua rasa das leis
Sob ternos engessados
Deitam homens no asfalto

E.W.R.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

Perto de perder o sono, ganhei olhar pela janela. Pássaros e ônibus já disputavam os primeiros ecos difusos do alvorecer. Caminhei até o arroz integral, com sal do Himalaia. Espero ter protegido a receita budista no refrigerador. Quatro horas. Oh, inferno estas batidas do soturno relógio; berram na parede.  Estranho por estranho, coloco um Frank Zappa na vitrola, baixinho. A bela vizinha é médica. Resolvi ficar na cozinha. Local de onde envio-lhes esta inútil carta de dormir. Na mesa de refeições, o segundo livro dos republicanos espanhóis. Franco, cai fora. Estou a poucos metros da pequena varanda. Estou só. Ademais,

cercado de automóveis, vidraças & aviões. A poucos centímetros desta angústia perene. Ela  me queima em turbilhão. Mas disseram que amanhã não verei nuvens, e sim um sol de banheira aquecendo a lucidez. Sussurram luzes na sacada alheia. É permitido voar em calmaria. Tranco-me em suspiros, ao deitar o corpo no sofá da sala de estar.


                      Outubro de 2018

                         E.W.R.

domingo, 6 de janeiro de 2019



Pela estrada
cai a noite.
Como é longe
o meu amor.

E no primeiro
passo dessa distância
lhe direi:
estou a caminho...


Elmo Wyse Rodrigues /
Milena Ribeiro

sábado, 29 de dezembro de 2018

PARA ALÉM DA ESTAÇÃO


Tão bonita
A tua presença,
Linha tênue, 
Algodão.

Nosso abraço
Urgente,
Lucidez das horas
Intermináveis.

Te esperei,
Quase desencontro
De estações.

Te vejo, pois,
Na janela do amanhecer,
Azul indelével.

Recebo-te,
E não fosses espera;
Recebo-te,
Relógio de sol,
Para além dos nossos verões.

elmo.


quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

CRIATURAS

Carrego o preço da vida. Esforço em vão. Desanimei, não posso mais sorrir. Desanimei pela angústia do cerco que me traduz. Pretensioso porvir, por que te afastas de mim? Por que não podes sonhar em nome da nossa geração? Por que te acenam, mundo cruel? Oráculo cinza, obscuro e fatídico. Eis o que restou da nossa geração. Única e nunca mais. Incerta época atrás, o falso profeta, Masoch, preconizou: "Não precisai despertar, pois já vos ofereço o chapéu e todas as dores do mundo!". A dor, primitiva e abduzida. E como receita mística de patrocínio. A minha culpa é ter apreço, como quem cria da criatura; o meu pecado foi não ter estendido uma mão abestalhada, em plena luz do dia...

       E.W.R.

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

A VIDA DECORRENTE DOS SARAUS

Depois de tanto tempo de estudo, entendi que precisava ter um pouco mais de conhecimento do que supostamente já sabia. Por isto estou aqui. Tentando aprender a dinâmica, a vida que existe nos saraus da cidade de São Paulo - um verdadeiro fenômeno mundial, esse tipo de  manifesto literário-musical, nesta urbe. Gosto deveras do movimento, da participação coletiva. Não se trata somente de quantidade - e há récitas em todos os  30 dias do mês. Mais de um até. Falo da importância cultural, da arte popular que resiste e ousa existir, apesar desses tempos bárbaros. E aqui mesmo surgiu a ideia de lançar um sarau em Porto Alegre, com base nestas experiências que estou imerso. Essa coisa de mesclar literatura e música é ancestral, a própria poesia se espalhou desta forma, através dos menestréis, na Europa antiga. Recordo com muita saudade do famoso sarau da Dona Maria, que ficava no centro histórico da capital gaúcha. E quem me levava lá era o grande agitador cultural e poeta, Nelson Fachinelli, diretamente responsável por lançar mais de mil poetas brasileiros, pelas centenas de coletâneas que organizava. Eu mesmo participei de uma três ou quatro. Lembro bem deste grande amigo pessoal, que quando falei da possibilidade de publicar o meu primeiro livro individual, ele, com a sua grandeza peculiar, insistia em me arrastar pelos saraus de Porto Alegre, os mais "cults", inclusive. Recém-chegado do interior, eu ficava ao seu lado, ainda que de forma tímida. Então, longa vida a esta forma de expressão popular e cultural!

São Paulo, dezembro de 2018

                          Elmo Wyse Rodrigues